sexta-feira, 26 de junho de 2020

Olho incansavelmente o brilho azul do mar.
O horizonte, infinitamente longínquo,
Com a minha mão tento alcançar.

Olho incansavelmente o brilho azul do mar.
Procuro continuamente o sonho que me sepultou
Nesta praia de areia negra e pura,
Onde caminho de alma perdida e nua...

Olho incansavelmente o brilho azul do mar.
Desejo no horizonte encontrar
O brilho extasiado dos teus olhos
Que as cruéis ondas, para longe, insistem arrastar.

Sozinha, caminho pela praia deserta.
Olho tristemente o brilho azul do mar,
Procuro outros olhos,
Procuro outro brilho,
Procuro Alguém para amar...


Junho de 2006
Noite, minha eterna confidente
Envolve-me na tua escuridão
Ofusca a minha alma doente
Liberta-me desta terrível solidão.

Liberta-me desta dor interminável
Desta sede de justiça insaciável
Deste sonho que tanto me atormenta
Deste corpo imundo que já não sente.

Partilhamos o mesmo destino;
Desejamos a luz que um Sol nos tirou,
Procuramos a alegria que alguém nos roubou.

Por fim, encontramos a morte que nos libertou
Do terrível silêncio assustador
Que durante tanto tempo nos aprisionou.

domingo, 17 de maio de 2020

O sabor da infância e a minha avó Francelina

David e Pedro, 

A minha infância teve muitos sabores, alguns deles fazem-me recordar momentos especiais e até mesmo pessoas. Sempre que vejo uma bomboca ou quando como uma, lembro-me da minha avó Francelina. Foi ela que me apresentou este doce tão peculiar, cheio de açúcar certamente, quase um crime nos dias de hoje para os pais mais fundamentalistas com a alimentação. Mas, a minha avó não era nada fundamentalista e muito menos com a alimentação. Ela que nasceu no ano da ditadura militar, foi mais uma protagonista deste país atrasado, pobre e faminto que atravessou mais de metade do século XX. Ficou órfã muito cedo, teve que cuidar dos irmãos quando ainda era criança. Acompanhou a Segunda Guerra Mundial e, como muitos da sua época, chegou a passar fome, 
daquela fome difícil de imaginar, que nos consome o corpo por dentro. 
Sobreviveu. E foi sobrevivendo sempre com um sorriso no rosto e uma alegria na alma a tudo o que lhe foi acontecendo ao longo da vida. Por isso, nas bombocas que a minha avó me oferecia existia muito amor, e é por isso mesmo, que elas são um dos sabores preferidos da minha infância. Sabem a chocolate, a baunilha e morango e também ao sorriso quente da minha avó. 

segunda-feira, 29 de abril de 2019

Coisas que a minha memória de peixe não quer esquecer (parte IV)

Parabéns, Pedro!!!

O meu eterno bébé, com olhos cor de mar, faz 3 anos!

O que se passa com o tempo que só sabe correr? No meio de tanta agitação, trabalho e afazeres receio sempre perder e esquecer as pequenas coisas, as pequenas lembranças, porque são elas que vão construindo, dia após dia, a nossa identidade.

Um dia , se leres isto, ficarás a saber que acordas sempre  bem disposto, mesmo quando é muito cedo. És um menino muito sociável e muito preocupado com os outros. Adoras o teu irmão e fazes tudo por ele, incluindo ceder os teus brinquedos favoritos.

És muito brincalhão, traquinas e divertido, mas por vezes lá aparece uma birra, porque também és um pouco teimoso. Quando a amuas cruzas os braços e viras as costas. Quando não queres comer mais dizes que tens tosse, que vem sempre acompanhada de uma lista interminável de "dói-dóis".

Gostas muito de pepino, tomate e chocolate. Aprendeste primeiro as cores em inglês do que em português e falas pelos cotovelos.

Gostas de brincar com plasticina, de carros, aviões e motas, de legos e de preparar refeições imaginárias para a mamã. Gostas de tirar as compras dos sacos e a loiça da máquina. 

Não gostas de dar "beijinhos", mas às vezes temos o privilégio de receber um. Gostas de animais, de correr, saltar e brincar em liberdade. 

E eu gosto tanto, tanto, tanto que tenhas aparecido nas nossas vidas! És um raio de sol que ilumina tudo à sua volta. Tenho a certeza que pela vida fora continuarás assim e que sejas sempre muito feliz! 









segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

O último dia

Enquanto me dirigia para o portão olhava para as salas vazias e cheias de silêncio. Naquelas salas eles partilharam histórias, as primeiras paixões, as zangas, as frustrações, mas também as gargalhadas, as preocupações, os sonhos e ensinam-me a crescer. Todos os anos aprendo sempre mais um bocadinho, mas em 2017/2018 aprendi um bocadinho maior. Os professores também aprendem e também crescem com os alunos, e apesar de lhes ter dito isto na última aula, acho que não têm noção da importância que tiveram (têm) no meu crescimento pessoal e profissional.  
 Durante meses construímos uma relação de proximidade, alguns falam mais e dão-se a conhecer mais, outros precisam de muita atenção, outros de um abraço ou um simples toque nas costas.  Existem os que querem um conflito, e são esses quem mais precisa de compreensão, firmeza e muita paciência.  

Todos os anos sinto um certo alívio quando o terceiro período acaba, mas também sinto um vazio... provavelmente nunca mais os irei ver, nem irei saber se estão bem ou não. Quero que tenham um bom futuro e que mais do que bons alunos, sejam boas pessoas. É nisto que penso quando escolho um poema, ou um texto para as aulas; uma música ou um exercício da tão odiada gramática; quando insisto que expressem a sua opinião e que digam o que realmente pensam e não o que eles acham que eu quero ouvir; quando ensaio uma peça de teatro ou organizo uma visita de estudo. 

Se tive recompensa? Sem dúvida! O entusiasmo pela escrita patente nos textos que me entregaram, o despertar do gosto pelo teatro e consequentemente pela literatura... e por fim um " vamos ter saudades" são a melhor recompensa. 

Até o final de agosto este vazio irá manter-se, depois, quem sabe, em setembro e com muita sorte do destino haja um regresso... há projetos por realizar.

Há anos assim, que ficam para sempre gravados em nós.

Escrito no dia 15 de junho de 2018

domingo, 27 de janeiro de 2019

Coisas que a minha memória de peixe não quer esquecer, Parte 3

Querido David;

Já fizeste QUATRO anos? QUATRO?!! Não estarei enganada? ☺️☺️☺️ Foi um ano de grandes mudanças para ti, imagino que mudar de escola não tenha sido fácil, mas agora pareces-me feliz. Contas-me o que fizeste quando te vou buscar, mostras-me com entusiamo os trabalhos que guardas na mochila e até cantas as músicas que te ensinam! 

A minha memória de peixe não quer esquecer que a tua música de Natal preferida é "O pinheirinho",  que durante o mês de dezembro me perguntaste todos os dias se o Pai Natal te ia dar a carrinha dos gelados e espero também recordar para sempre a expressão que fizeste ao abrir o presente.

Já não gostas muito da Patrulha Pata, mas ainda vibras com os PJ Masks, Super Wings, a Dora e o Diogo. Sabes o nome de muitos animais ("Isso não é um tigre, é uma chita", disseste-me uma vez).

Não gostas muito de pintar com lápis, mas gostas de pintar com tintas. Gostas de construções, de plasticina e de fazer cozinhados imaginários.

Ralhas com o Pedro quando ele faz alguma asneira e quando não quer comer a sopa, no entanto sabes as suas comidas favoritas e reclamas comigo quando lhe dou alguma coisa que ele não gosta.
Dás o nome correto aos alimentos: "Não se diz peixinho, diz-se peixepeixinho é feio!", "Chama-se tomate cereja!".

Adoras andar de escorrega e de baloiço, tanto que é sempre um drama para vir embora.

 Aprendeste os números e as cores em inglês sozinho, gostas de explorar os livros e fingir que já sabes ler. És muito curioso, atento e observador (A Torre Eiffel tem um elevador que leva pessoas lá em cima; Este Pai Natal não é o mesmo", Aquele carro não parou no vermelho; As mãos têm muitos micróbios...). 

Coisas simples eu sei, mas que quero guardar para sempre!








sábado, 26 de janeiro de 2019

Coração nas mãos

A tristeza pela morte de uma criança deve ser o sentimento mais universal que existe. Deixa-nos sempre com o coração destroçado, mesmo quando não a conhecemos. Queremos abraçar os pais e gostariamos de dizer que o tempo "cura tudo", mas a verdade é que não cura. Neste caso não. 
Faz-nos pensar que não conseguimos controlar tudo, que não somos omnipresentes e que na verdade somos muito pequeninos. 


Os pais andam sempre com o coração nas mãos. Primeiro, a certificar que estão a respirar enquanto dormem (certamente não terei sido a única mãe a acordar o bebé enquanto dormia porque não ouvia a sua respiração), depois, quando se engasgam, quando começam a andar e a cair, quando correm demasiado, quando escorregam, quando ficam doentes, quando aparecem manchas no corpo, quando vamos na estrada... são tantas, tantas, tantas coisas...  às vezes preferia desligar o cérebro um bocadinho que fosse. 


O que aconteceu com o menino Julen faz-me pensar ainda mais nestas coisas. Por muito atentos que sejamos basta uma pequena distração para o mundo desabar... e ficam sonhos por cumprir... memórias que nunca acontecerão... abraços e beijos por dar... histórias por contar... risos por ouvir... fica o silêncio. 

Imagem retirada de: https://noticias.bol.uol.com.br/ultimas-noticias/ciencia/2017/03/08/e-possivel-morrer-de-coracao-partido.htm